domingo, 23 de maio de 2010

São Miguel do Gostoso - parte I

Essa não é uma redação de primeira série sobre "minhas férias", embora isso evoque pensamentos saudosos do tempo em que a maior dificuldade de nossa vida era escrever um texto com início, meio e fim. Voltei de férias (a primeira de uma vida com muitas mudanças de rumo) e estou absolutamente tomada pela síndrome de abstinência. Em minha viagem a São Miguel do Gostoso - esse lugar existe! - reafirmei minha escolha de aliar a gastronomia ao marketing.

Quem tem contato com o tal do marketing, sabe que muito se fala dos P´s (de contagens incertas, dependendo do autor), mas em meu descanso tudo que eu queria eram dois outros esquecidos P´s: Paz e Praia. Mas vi que ao invés de curtir apenas "os esquecidos", uma avalanche de marketing, gastronomia e diversão tomou a minha cabeça.

Voei para Natal dia primeiro de maio, dia do trabalho, o que achei poético para a primeira viagem de férias. Após 120 km de estrada exuberante em companhia de um motorista muito simpático, cheguei ao meu destino final e fui tomada por uma série de sentimentos que consegui traduzir em pensamentos absurdos e perigosos:
  1. "Aqui o céu é maior!"
  2. "É impossível ficar doente num lugar como esse."
  3. "Por que se tranca uma porta mesmo?"
  4. "Eu não sou incapaz de matar um pernilongo aqui! Ele faz parte da natureza." (esse pensamento se dissipou após a primeira rave de pernilongos em meu quarto)
Ao chegar na pousada já comecei a pensar que qualidade de serviço é receber aquilo que se precisa, e não necessariamente ver pessoas seguindo protocolos de treinamento. Muitas vezes boa vontade basta. Claro que em férias é muito mais fácil pensar que está tudo bom, então decidi testar esse pensamento quase anárquico sempre que possível.

Um dos fatores mais importantes para avaliar uma experiência é a expectativa que se tem do que se vai receber. Aqui estava uma dificuldade: cheguei lá sem qualquer expectativa a não ser "paz e praia", e isso foi cumprido lindamente.


Como saber se minha mente em processo de hibernação marketeira conseguiria avaliar criticamente a situação? Meu objetivo primário era descansar. Eu tinha uma suíte com ar condicionado, frigobar e varanda com rede. Estava numa pousada pé na areia. O que mais eu preciso? Nada. Depois de um tempo comecei a perceber que ninguém tinha me vendido mais do que eu estava recebendo. Ninguém me disse que lá eu encontraria um caixa eletônico conveniado à rede 24H, então não ter um não poderia ser um  problema. Ninguém me disse que eu teria uma banca de jornal ou livraria, logo, seria injusto eu me revoltar contra a cidade por não me oferecer essa opção de compra.

Outra variável que afetou em minha avaliação: curti São Miguel do Gostoso na baixa temporada. Isso fez com que eu recebesse muito mais do que recebe um cliente regular. Eu era uma das poucas turistas na cidade e em pouco tempo eu já tinha conhecido os donos de diversos restaurantes e bares. Ao chegar num local, geralmente vazio, era bem possível que o dono se sentasse à minha mesa e batêssemos longos papos sobre a vida naquela cidade, os negócios, família... e terminássemos a noite como grandes amigos.

Com todas essas experiências reafirmo minha convicção: expectativa é tudo. Abracei a cidade com tudo o que ela tinha para me oferecer. O que ela não tinha, ninguém havia me dito que teria, então minha mente em férias assumiu um papel importantíssimo e me permitiu relevar. O problema daqui pra frente será viver aquela cidade na alta temporada: não terei meus novos amigos sentados à minha mesa, eles estarão enlouquecidos com os demais turistas.