Essa não é uma redação de primeira série sobre "minhas férias", embora isso evoque pensamentos saudosos do tempo em que a maior dificuldade de nossa vida era escrever um texto com início, meio e fim. Voltei de férias (a primeira de uma vida com muitas mudanças de rumo) e estou absolutamente tomada pela síndrome de abstinência. Em minha viagem a São Miguel do Gostoso - esse lugar existe! - reafirmei minha escolha de aliar a gastronomia ao marketing.
Quem tem contato com o tal do marketing, sabe que muito se fala dos P´s (de contagens incertas, dependendo do autor), mas em meu descanso tudo que eu queria eram dois outros esquecidos P´s: Paz e Praia. Mas vi que ao invés de curtir apenas "os esquecidos", uma avalanche de marketing, gastronomia e diversão tomou a minha cabeça.
Voei para Natal dia primeiro de maio, dia do trabalho, o que achei poético para a primeira viagem de férias. Após 120 km de estrada exuberante em companhia de um motorista muito simpático, cheguei ao meu destino final e fui tomada por uma série de sentimentos que consegui traduzir em pensamentos absurdos e perigosos:
- "Aqui o céu é maior!"
- "É impossível ficar doente num lugar como esse."
- "Por que se tranca uma porta mesmo?"
- "Eu não sou incapaz de matar um pernilongo aqui! Ele faz parte da natureza." (esse pensamento se dissipou após a primeira rave de pernilongos em meu quarto)
Ao chegar na pousada já comecei a pensar que qualidade de serviço é receber aquilo que se precisa, e não necessariamente ver pessoas seguindo protocolos de treinamento. Muitas vezes boa vontade basta. Claro que em férias é muito mais fácil pensar que está tudo bom, então decidi testar esse pensamento quase anárquico sempre que possível.
Um dos fatores mais importantes para avaliar uma experiência é a expectativa que se tem do que se vai receber. Aqui estava uma dificuldade: cheguei lá sem qualquer expectativa a não ser "paz e praia", e isso foi cumprido lindamente.
Como saber se minha mente em processo de hibernação marketeira conseguiria avaliar criticamente a situação? Meu objetivo primário era descansar. Eu tinha uma suíte com ar condicionado, frigobar e varanda com rede. Estava numa pousada pé na areia. O que mais eu preciso? Nada. Depois de um tempo comecei a perceber que ninguém tinha me vendido mais do que eu estava recebendo. Ninguém me disse que lá eu encontraria um caixa eletônico conveniado à rede 24H, então não ter um não poderia ser um problema. Ninguém me disse que eu teria uma banca de jornal ou livraria, logo, seria injusto eu me revoltar contra a cidade por não me oferecer essa opção de compra.
Outra variável que afetou em minha avaliação: curti São Miguel do Gostoso na baixa temporada. Isso fez com que eu recebesse muito mais do que recebe um cliente regular. Eu era uma das poucas turistas na cidade e em pouco tempo eu já tinha conhecido os donos de diversos restaurantes e bares. Ao chegar num local, geralmente vazio, era bem possível que o dono se sentasse à minha mesa e batêssemos longos papos sobre a vida naquela cidade, os negócios, família... e terminássemos a noite como grandes amigos.
Com todas essas experiências reafirmo minha convicção: expectativa é tudo. Abracei a cidade com tudo o que ela tinha para me oferecer. O que ela não tinha, ninguém havia me dito que teria, então minha mente em férias assumiu um papel importantíssimo e me permitiu relevar. O problema daqui pra frente será viver aquela cidade na alta temporada: não terei meus novos amigos sentados à minha mesa, eles estarão enlouquecidos com os demais turistas.